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Situação Crítica

Situação Crítica

27/07/16

a walk down memory lane

Tenho 23 anos há uma semana e meia. Parece que não mudou nada, que nada muda há muito tempo, que tudo é estase. As coisas que acontecem têm consequências inconsequentes e assim passam os dias e as semanas. O tempo é paradoxal, porque passa tão rápido que torna as coisas próximas longínquas.

Hoje fui confrontada com uma realidade que costumava conhecer. Pessoas que já não são, lugares que foram, contextos idos. E tudo o que mudou, lentamente, foi independente de mim e das minhas decisões. Mesmo o que é igual não se mantém por mim. Apesar de tudo, o que mais me fascina é que a saudade se desvaneceu. Foi-se a taquicardia, a angústia, a sensação de vísceras estranguladas. Ficou uma serenidade que sempre invejei nos outros mas que hoje me inquieta.

O que era fácil, hoje é estranho. O que era desconfortável, hoje faz falta. O que um dia me definiu, hoje é muito diferente de mim.

Talvez o que acontece não seja assim tão inconsequente. Talvez empurre o que existe imperceptivelmente num sentido, porque entre dois pontos adjacentes há o infinito.

03/08/14

British fun times #1

Ontem à noite num restaurante wannabe-fashionable em Kensington, uns ingleses que acompanhavam o seu jantar dos mais diversos cocktails olhavam para mim horrorizados enquanto eu comia o meu chicken burger à mão. Nunca me senti tão portuguesa.
13/07/14

Sabedoria festivaleira - o masterpost


  1. Ver os Arctic Monkeys ao vivo não é um concerto, é uma experiência sexual.

  2. Não há escapatória: por muito que se tente fugir, há sempre um homem suado e semi-nu nas redondezas.

  3. Também é impossível evitar a miúda tão sob a influência de coisas variadas (nem quero saber quais) que passa o tempo todo a dançar de forma desagradável e expansiva, a ocupar o espaço alheio, mas que provavelmente nem sentiria a rasteira que merecia.

  4. Há infinitamente mais contacto íntimo entre seres humanos do que o desejado.

  5. Tens dinheiro? Queres cerveja? Ah, tens 12 anos? No problem.

  6. Ir extremamente cedo para ficar a torrar ao sol durante horas não compensa.

  7. Há mais gente com GoPros do que com calções a tapar as nádegas.

  8. Sim, é possível escaldar as orelhas. Sim, é uma chatice.

  9. Às vezes é mais fácil entrar numa multidão do que sair dela.

  10. Se os festivais tivessem uma fragrância oficial, ela teria notas de suor, cigarros, cerveja e substâncias ilícitas.

  11. Gritos de elementos do sexo feminino são mais prováveis de causar surdez do que estar mesmo ao lado das colunas.

  12. Pés? Já nem os sinto.

  13. Não é fixe tentar parecer fixe.

08/07/14

Li e pensei coisas - Gone Girl & Dark Places

 

Na minha experiência enquanto leitora, é raro pousar um livro com a sensação acre de ter um profundo ódio por todas as personagens que povoam o imaginário daquelas páginas. Mas é aquele ódio tão palpável e vibrante que se instala e que dá prazer alimentar. Apesar de pouco frequente, essa sensaçao persegue-me depois de ter lido Gone Girl e Dark Places, as duas obras mais recentes de Gillian Flynn. Li-os de uma assentada, um imediatamente depois do outro, ávida de qualquer coisa para encher o buraco que Gone Girl deixou na minha esperança na humanidade.

Digo isto já para que estas leituras não firam susceptibilidades desprevenidas: estes livros não são felizes. Não é algo que se leia para levantar o espírito, mas antes para concretizar um prazer negro de olhar para dentro do poço da mente humana e de ver que afinal a água não é tão límpida e imóvel como se pensava.

Gone Girl é a história de um Nick e Amy Dunne, um casal de escritores sediados em Nova Iorque que se muda para a América profunda depois de vicissitudes familiares e económicas. Na manhã do 5º aniversário do seu casamento, Amy desaparece sem deixar rasto - a porta aberta e o gato na rua - e Nick é rapidamente alvo das mais radicais acusações. Esta é a superfície aparentemente estável e transparente. Mas no fundo revolvem-se as lamas de coisas que ficaram por dizer e de histórias mal contadas. A água vai enturvando. Os temas são simples e clássicos: o casamento, o dinheiro, a cobardia, os elitismos sociais, a capacidade do ser humano de inflictir dor no seu semelhante, o preconceito, as más decisões, a honestidade (ou falta dela). Nada de novo, que não tenha sido analisado até se ver o osso, mas esta obra expõe-nos de forma tão crua que dói e nem sabemos bem onde, como ver alguém nu e ferido à chuva. Estas são páginas que exploram até que ponto vão as intenções humanas.

Dark Places, sendo semelhante ao anterior, ilumina um diferente conjunto de questões. Ben Day, de 15 anos, é preso pela chacina da mãe e de duas irmãs. Mal visto pela comunidade, com fama duvidosa, companhias pouco desejáveis, não deixa qualquer dúvida que é o resposável pela morte da família. 24 anos depois, Libby Day, a irmã mais nova de Ben e a única sobrevivente do massacre, revê o seu testemunho, peça central no caso contra o irmão. A história tem três pontos de vista principais, o de Libby, o de Ben e o da sua mãe Patty, mas a mensagem que trazem é a mesma: o ser humano é fraco, é imperfeito, e sabe que não tem redenção. Abordam-se outros temas, como a pobreza, a histeria dos rituais satânicos e a toxicodependência, que se conjugam numa trama que é maravilhosamente gráfica no seu carácter horribilis, profundamente perturbadora. 

A escrita de Flynn é um perfeito intermédio entre simples e complexo, que envolve sem darmos por isso, tão natural ao inserir o leitor no pensamento dos intervenientes na história. Chega a ser desconfortável a intimidade que temos com as motivações das personagens, como se estivéssemos a interromper um momento solene que não é nosso, nunca vai ser nosso. É um noir delicioso, quase vampírico na maneira que usa a nossa força vital e as nossas crenças contra nós ao alimentar as personagens. Não é para todos, mas abala as consciências de muitos, incluindo a minha.

 

(Ambos os livros estão a ser adaptados ao cinema. Podem encontrar aqui e aqui os trailers de Gone Girl, realizado por David Fincher.)

22/06/14

Destruction completed.

As minhas vizinhas do segundo andar vão mudar de casa. Só fico eu e a outra do terceiro andar. Não vão mudar-se para uma distância dramática, é já na rua em frente, não vão ficar prisioneiras do seu próprio T3. Contudo, e por alguma razão misteriosa, sinto que é o fim de uma Era. O fim de um Éon.

No primeiro ano em que morámos juntas, eu costumava invadir o apartamento delas, sentar-me no chão entre as camas com os meus apontamentos de anatomia. Alguém se sentava a enrolar cigarros num canto, alguém lia tomos sobre microeconomia, bebiam-se umas cervejas com vista para Lisboa menina e moça, comiam-se uns tremoços. E eu adormecia no soalho frio, a babar-me sobre uma almofada sebosa do Benfica, acordava de madrugada e arrastava-me silenciosamente escadas acima até à minha própria cama. Alguém se escondia dentro do guarda-fatos para fazer telefonemas, alguém matava mosquitos em pleno Verão com uns chinelos enfiados nas mãos (eu), alguém adormecia em cama alheia com um artigo sobre peritoneu precariamente equilibrado sobre a face (de novo eu - vêm o tema "a dormir em locais indevidos"?). Chegámos a ser acusadas por outras vizinhas de levar a cabo festanças com substâncias ilegais a altas horas da noite. (Enquanto na verdade estávamos reunidas em volta de uma mesinha de cabeceira a comer amendoins. Wild.)

No segundo ano em que morámos juntas, ajudámo-nos umas às outras a vestir o pijama em diversos estados de intoxicação, efectuamos higiene dentária reciprocamente, deslocámos as nossas celebrações para o café do bairro e não hesitámos em fazer interventions em alturas de extrema necessidade. Bebeu-se poncha da Madeira. Nesse ano, não houve Semana Académica, mas houve cantar na rua às duas da manhã. Houve sustos, riso histérico e danças eróticas com garrafas de água ao som de música brasileira.

No terceiro ano em que morámos juntas, houve quem chorasse, houve quem gritasse. Coleccionaram-se copos de plástico peganhentos de bebidas alcoólicas pouco indentificáveis para se beber mais uma cerveja, só mais uma. Dormimos no Outono tostadinho do Alentejo, fomos a velórios e apresentaram-se namorados à família. A dona da amofada sebosa celebrou um campeonato e ninguém teve ressentimentos. Escreveram-se fitas, comeu-se bolo e bebeu-se champanhe. Fizeram-se planos a longo prazo e a curto também. 

As minhas vizinhas do segundo andar vão mudar de casa. É já ali. Até já.

19/06/14

Era Maio e eu roía as unhas.

É incrível como já na minha década dos 20 muitas das frases começam por: "Eh pá, lembras-te..." E acabam com um gigantesco e pesado ponto de interrogação que fica ali a pairar em cima da mesa do restaurante, debaixo da luz apropriada para casais, a ameaçar cair dentro do meu copo de sangria. Estas memórias evocadas não se limitam a pessoas, mas a momentos incrivelmente específicos. Surpreendo-me constantemente pela quantidade de coisas importantes que nunca cheguei a reter e a absurdidade de detalhes absolutamente menores que estão tão frescos como quando os vi pela primeira vez.

Também tenho uma espécie de Mind Palace. É uma sala muito particular onde são sempre seis da tarde, há um retrato do Liszt na parede. Dois pianos. Cortinas pesadas. Peitorais em granito sob janelas altas e estreitas. Há manchas de verniz das unhas na porta e no chão. Quando se presta atenção ouve-se sempre o mesmo excerto de Chopin, em loop perpétuo. As mesas estão dispostas em U e eu estou sempre sentada num canto, de frente para a porta que raramente abre e é escondida por um quadro gatafunhado de escalas e intervalos e ditados dos clássicos que um CD qualquer tocou. Cheira a partituras velhas, cadernos rasgados e resina. Naquelas mesmas cadeiras critiquei dedos partidos, mini-saias, namoradas, professores, decisões, e cantei pessimamente linhas melódicas atonais. O que me fascina é a forma como associo as minhas memórias a esse sítio onde já não entro há anos. Sei que ainda existe, que as mesas já não estão em U, que os pianos já devem ter sido movidos e afinados, já outros pés pisaram a carpete que não os meus. Mas na minha cabeça, aquela sala será para sempre o local ligeiramente poeirento dos meus 13 anos. Tocam-me no ombro, eu viro-me e sorrio a uma pessoa que está sentada ao meu lado e é em si uma memória. Pergunta-me porque estou tão pensativa hoje. Hoje que é o mesmo dia da última vez que visitei as coisas de que me lembro. Hoje que é aquele longuíssimo dia de Maio. Digo que não se passa nada, abro o caderno - as minhas unhas estão roídas - procuro a memória que me interessa nas entrelinhas.

18/06/14

O ponto da situação.

Já fui uma gaja que escreveu muita coisa em muitos blogs e que já se importou com a opinião alheia. Agora o que me apetece mesmo é documentar esta parte da minha vida para no futuro mostrar aos netos e, espero eu, para o entertenimento de quem quer que seja que ainda deambule por aqui (bless you).

Continuo a viver no terceiro andar. A janela continua a ter vista para a bandeira portuguesa no Parque Eduardo VII, toda patriótica a dar a dar. Neste momento, alguém está a usar o bidé mesmo por cima do meu quarto, o que é um bom agoiro da higiene das minhas vizinhas. Continuo a não tirar o pijama se não vou sair de casa. Continuo a caminhar em direcção ao Juramento de Hipócrates.

Mas amanhã tenho doentes para ver porque o curso não tem piedade (inserir Bon Jovi a cantar we're halfway theeeeere), leio mais livros, ouço mais música, tenho mais paciência. Há mais calhamaços na prateleira. Tenho o cabelo mais curto. Deixei de beber chá porque me dá azia.

Apetece-me escrever banalidades da minha vida e reflectir sobre coisas provavelmente inconsequentes para o resto do mundo. Vamos lá testar a minha persistência.

06/08/13

Sair de casa para dummies - Olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço #1

Sair do leito paternal é ver que a rua que passa em frente à nossa casa de infância deixa de ser uma rua e passa a ser uma rua que leva a outro sítio. E nesse sítio nós vamos depender de nós e apenas nós. É um terror particularmente intenso para aquelas pessoas que, como eu na altura, têm 18 anos e pouco mais, nunca passaram muito tempo longe de casa, têm ambições muito grandes, uma auto-confiança definitivamente menor e um talento quase inexistente para fazer algo com um aspirador que não seja encenar momentos do Ghostbusters. É possível que seja necessário um pouco de imprudência, não sei, para dar esse passo maior que a perna. Mas não é nada que não se faça, nada que nunca tenha sido feito. Pode ser que até custe mais à família do que a nós (eis que surge o paradigma do filho único e da casa vazia). Mas, como (quase) tudo, resolve-se com conversa, explicar que o mundo não está a acabar mas a expandir, que existem telemóveis, computadores, skype, facebook e veículos móveis que se deslocam desde que haja combustível. Ok, sair de casa pode criar mais ansiedade do que mudar de marca de papel higinénico, mas é uma cidade nova, pessoas novas, novo estilo de vida, e uma oportunidade para começar de novo sem expectativas alheias, sem fulano disse que... (especialmente quando se vem de meios pequenos que podem ser altamente tóxicos). Só com objectivos. Quando um estudante universitário começa a sua vida académica é com metas apenas, não há mais que se possa pedir.

 

E quanto à parte prática:

  1. Onde ficar? - preços para aqui, proximidade ao autocarro para ali, o OLX continua cheio de ofertas e a cabeça sem saber o que decidir, as mãos tremem todas e só apetece puxar os cobertores por cima da cabeça e ter 9 anos outra vez. Arranjar um bom sítio onde ficar é, sem qualquer dúvida, um óptimo primeiro passo. Os meus conselhos: pesquisar (há muitas ofertas e a internet ajuda imenso), considerar preços (como é óbvio uma casa no centro da cidade não vai ter a mesma mensalidade que uma casa nos subúrbios; ver sempre a relação preço-qualidade, se inclui despesas, qual é o ambiente), investigar acesso aos transportes (especialmente quando não é possível ter carro ou ninguém que organize boleias, é sempre preferível encontrar um sítio o mais perto possível do metro/autocarro), ver como são as redondezas (proximidade à farmácia, café, supermercado...), ir ver o alojamento antes de escolher (sempre que possível, claro, porque muitas ofertas são enganadoras).
  2. Residência ou casa/apartamento/quarto? Sozinho ou acompanhado? - depende da personalidade de cada um, mas não aconselho de todo viver completamente sozinho quando se está fora de casa pela primeira vez. Ficar em casa de familiares, ir viver em conjunto com amigos, tudo é válido. Acaba por ser mais agradável estar acompanhado, porque ir de viver com a família para me, myself & I é uma mudança brusca. É sempre bom ter alguém quando se chega a casa, alguém que nos irrite, alguém que ajude com as limpezas, alguém que esteja ali sentado a existir, no mesmo barco que nós. Quanto ao tipo de alojamento...whatever tickles your fancy. E o orçamento. Residências são úteis quando se está completamente sozinho e podem ter preços muito diferentes, dependendo do tamanho e condições que oferecem (algumas podem até dar alimentação, o que é fantástico quando se chega da faculdade às oito da noite e a última coisa que nos apetece é ir fazer o jantar). Partilhar uma casa/apartamento deve ser algo planeado e aconselho especialmente a quem não queira gastar tanto dinheiro, porque assim partilha-se o espaço mas também as despesas.
  3. Home is where the heart is. - Pôr livros nas prateleiras (mesmo que acabemos por não os ler), instalar a colecção que sempre quisemos de gatos de porcelana, flores, pósters dos Backstreet Boys, o cobertor de retalhos que a avó fez, candeeiros de lava...o importante é tornarmos um espaço que ao início é extremamente impessoal num sítio nosso, onde queiramos ficar, estudar, viver. Se não nos sentirmos confortáveis na nossa privacidade, é complicado sentirmo-nos confortáveis na vida académica.
  4. Alimentação. - Massa com atum ao almoço, massa com atum ao jantar, a porcaria da masssa com atum já me está a enjoar. Pois, a comida da mãe já não está quentinha à espera na mesa. Mas não há que temer. É só preciso caixas onde guardar comida e um congelador e presto, comida caseira todos os dias. Em opção, há sempre as cantinas e os bares da faculdade que normalmente têm preços razoáveis. Ou então podem ser como eu e tomarem a decisão de se tornarem mestres da massa com atum, a não ser que gostem mesmo de cozinhar, e a essas pessoas aconselho qualquer um dos livros da Nigella ou do Jamie Oliver.

Sair de casa não é um bicho de sete cabeças. É uma questão de planeamento, motivação e vontade. Não digo para não terem medo. Tenham o medo todo. Medo, medo, medo. Desde que saibam que o tempo passa mais depressa do que estamos à espera e que o Homo sapiens tem uma capacidade espectacular de se adaptar e de sobreviver à selecção natural, ou então não estávamos aqui. You've been Darwined!

 

Next time on Situação Crítica: O fenómeno flatmate - Olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço #2

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