Dois dedos de mágoa, dois cubos de gelo.
Persegue-me a sensação de uns lábios encostados timidamente à junção do pescoço com o ombro. Uma boca morna que eu reconheço apesar de nunca lhe ter sentido a humidade, a temperatura, a textura.
É um toque que não está lá nem é uma memória de uma sensibilidade subestimulada. É uma utopia.
Nunca fui adepta da sensação de calafrio na espinha, esse sinal de significado quase psíquico de que algo está mal, nem que seja só a temperatura da tarde. Mesmo assim vejo-me cada vez mais paralisada pelo medo de estar a ser observada por uma qualquer força superior que não é Deus, mas é um Ele, sempre foi um Ele desde o primeiro dia, o dia em que nasceu esse monstro disforme e disfuncional em forma de Eu e Ele que anda em agonia por aí fora, deitado numa qualquer calçada portuguesa onde os nossos pés não caminharam juntos.