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Situação Crítica

Situação Crítica

30/07/13

Step into my office.

Não sei se é do meu ávido consumo de vlogs no youtube, mas subitamente tive a sensação (provavelmente errónea) de que as minhas opiniões podiam ser relevantes.

Estamos quase à boca do mês de Agosto, e se há tópico sobre o qual gosto de dissertar é sobre esta vida académica que levo, tal como muitos outros que por aí andam a penar sobre a calçada por causa de curtas noites de sono.

Já dei um cheirinho disto o ano passado, em posts como 10 conselhos para estudantes de medicina (ou prospectivos), e como o blog anda extremamente parado, decidi que não seria má ideia pôr este tema a discussão. Não sei se este apelo vai dar em algo, mas para o caso de existirem almas que, ao ler isto, achem que a minha esparsa sabedoria pode servir de alguma coisa, digam de vossa justiça. Sei que às vezes é complicado enfrentar uma etapa nova, mudar de casa, entrar com o pé direito, enfim, toda a panóplia de inevitabilidades associada com ir para à faculdade. Por isso abro os braços a qualquer questão, sugestão para post, partilha de experiências ou pedido em geral que tenham. Isto numa tentativa de dar vida ao estaminé e ajudar alguém no processo - vocês mesmos ou até alguém que conheçam.

Portanto...yap.

Vou ficar só aqui...

Sentada...

À espera...

(Não tenho vida própria. I'm a sad little person.)

20/06/13

Dois dedos de mágoa, dois cubos de gelo.

Persegue-me a sensação de uns lábios encostados timidamente à junção do pescoço com o ombro. Uma boca morna que eu reconheço apesar de nunca lhe ter sentido a humidade, a temperatura, a textura.

É um toque que não está lá nem é uma memória de uma sensibilidade subestimulada. É uma utopia.

Nunca fui adepta da sensação de calafrio na espinha, esse sinal de significado quase psíquico de que algo está mal, nem que seja só a temperatura da tarde. Mesmo assim vejo-me cada vez mais paralisada pelo medo de estar a ser observada por uma qualquer força superior que não é Deus, mas é um Ele, sempre foi um Ele desde o primeiro dia, o dia em que nasceu esse monstro disforme e disfuncional em forma de Eu e Ele que anda em agonia por aí fora, deitado numa qualquer calçada portuguesa onde os nossos pés não caminharam juntos.

07/06/13

Passivo.

A única coisa que lhe restava, com a mala feita em cima da cama, as camisas passadas, as calças vincadas, a juventude atirada ao fogo, era chorar o seu desespero. Não tinha futuro incerto, nem desgraças a coroar-lhe a cabeça, mas inudou-o o mais negro arrependimento, o mais profundo terror, de ter sido homem de menos, de ter deixado acontecer porque o tempo resolve tudo.

Não deu a risada seca de um hipócrita. Não olhou em volta com olhos vazios, a recalcar uma infância pouco extraordinária. Chorou. Ruidosamente. Espectacularmente. Limpou o nariz à camisa tão branca e tão lisa, as mãos molhadas às calças.

Ela, por outro lado, estava sentada no chão, a sorrir. Vestida de homem mas com o cabelo solto. Podia ter esticado a mão para lhe tocar no joelho, confortá-lo, dar-lhe só um pouco de calor alheio, perguntado e tentado entender, porque é isso que passamos os dias a fazer. Ela lambeu os lábios e viu enquanto ele se desfazia em lágrimas gordas e inspirações duras. Levantou-se num momento de silêncio e, com um movimento quase violento, empurrou-lhe o queixo para que a olhasse nos olhos.

- Gostava que nunca tivesses existido. Mas estás aqui.

Passou-lhe a mão gentilmente pelo cabelo e ele lembrou-se subitamente do porquê da sua miséria.

24/03/13

Johnny Stranger.

Estou a ser generosa quando digo que ele não sabia tocar guitarra. Ou banjo. Sentava-se nas escadas da cozinha, descalço, ria-se e tocava umas notas que nem ele sabia quais eram nem eu. A voz dele era outra coisa. Ligeiramente aguda, com um vibrato natural, não domado, selvagem. Abanava-se lentamente ao som do que quer que seja que tocava dentro da própria cabeça, dedo grande do pé a subir e descer ritmicamente, a roçar no soalho.
Era assombroso, para ser sincera, vê-lo assim. Tão imerso que eu deixava de o ver no matagal dele mesmo.
O que nos uniu primeiro foi uma paixão um pelo outro. Depois, foi uma paixão comum às palavras e às ideias por trás delas, pela maneira como podiam ser cantadas, rolar da língua quase com luxúria (para ele) e pela maneira como podiam ser conjugadas para formar padrões intrincados, pegar numa coisa simples e explicá-la à exaustão da complexidade (para mim). Por isso é que continuávamos ali depois de o deslumbramento ter acabado. Sempre fomos de nos entreter com rococós. Nunca tivemos importância. Éramos só duas pessoas juntas.
Quis escrever sobre isto porque a memória dele aparece-me sem razão, naquele limbo entre acordar e continuar na doce ignorância do sono. Às vezes lembro-me do nome dele, outras não. Mas normalmente fico só em pé naquele mesmo sítio da cozinha, como a pessoa que sou hoje, a olhar para ele e para além dele, como a pessoa que ele era então.
Não sei quem ele é. Agora. Não sei quem ele é agora. Podíamos estar sentados à mesma mesa, a ter exactamente as mesmas conversas, e eu só o acharia vagamente familiar.
Mas ainda lhe vejo a franja molhada a cair para a testa.
01/03/13

Hipócrates, perdoa-me.

Escolhi, literalmente, uma profissão de sigilo. Juramos a tal no dia em que o canudo encontra a mão e o Hipócrates vai-nos escrito na pele como se fosse um Pai Nosso. Mas isto é tudo teoria até deixar de ser, até ao momento em que, inevitavelmente, acontece a metamorfose de médico a confessor. Devia assustar-me, esta história de saber os segredos de cada pessoa que se senta do outro lado da grande muralha da China que é aquela secretária, quer ache que precise da minha ajuda ou não (e surpreende-me sempre a quantidade de pessoas que passam por aquele consultório a achar que nos estão a fazer um favor). Não assusta. Não perco sono com as maleitas e conflitos alheios, apesar de, no momento, poder perder a paciência, que já é escassa. No entanto, apercebemo-nos que somos todos iguais porque, enfim, aqueles segredos passam de certa forma a ser nossa responsabilidade, não só de guardar, mas de fazer alguma coisa, mesmo que esteja fora do nosso alcance. A partir do momento em que o doente diz algo que não pode ser repetido, é como se houvesse um coro geral dos anjos a cantar pronto, doutora, a responsabilidade agora já não é minha, é sua.

Resolva.

08/02/13

A dicotomia de K e X.

Acho que foi sempre uma questão de orgulho. Ambição de encontrar, enfim, aquela centelha de individualidade, procurando-a nos outros, na arte, na ciência, no resto do mundo, em todo o lado menos onde ela está. Pode ser que isto soe simples demais, compreender alguém será certamente mais que isto. Mais que entender que o que fazemos é apenas a procura não de um destino, um fado inevitável, mas de um motivo para continuar a procurar sabendo que não há nada do outro lado (o finito) dessa busca. No entanto, acaba por ser tão fácil como isto, analisar em nós para ver nos outros.

Por isso é que eu e X, sendo iguais, éramos tão diferentes. X procurava ser mais para procurar a imortalidade de um nome. Eu procurava ser menos para encontrar uma qualquer falha no sistema por onde desaparecer.
O mais fácil é invocar querer ou não ser percebido. O complexo (e o que nos leva a uma epifania que nos conduz à tal procura) é olhar para dentro e perceber que ninguém nos pode salvar de nós mesmos. 
28/01/13

December's Blues

Ela era monumental, sentada a lamber o dedo e a enrolar cigarros. A atirá-los para dentro de um copo de plástico, ouvindo o filtro estalar contra o fundo. O tabaco a cair nos pés, unhas de verniz estalado, a confiança de quem fala da sua intimidade como se fosse alheia. Camisa de flanela a tombar-lhe sobre as coxas, dedos dos pés irrquietos quando ri, e o sangue sobe-lhe às maçãs do rosto como se estar satisfeita fosse motivo de vergonha. Depois atirou a cabeça para trás, numa posição de quase êxtase, acendeu um fósforo e levou-o aos lábios.

- Não sei. Acho que as pessoas são demasiado simples para eu as perceber.

Eu tirei-lhe o cigarro de entre os lábios.

- Não te percebo.

- Isso é porque eu sou simples.

Sorriu com os olhos e com a boca e naquele momento quase que a entendi. Olhei para o Cristo na parede e fumei sem dizer nada. Eu queria que chovesse para acabar com aquele silêncio infernal.

- Que estás a fazer?

Encolhi os ombros, passei a língua pelos lábios gretados.
- Estou a absorver. 

19/07/12

People are strange.

Ela lambeu os lábios, as gretas ríspidas a saber ainda à madeira rude do cachimbo e ao pesado sal do chouriço. O cabelo caía-lhe sobre o rosto cansado, farripas grisalhas, salpicadas do negro de uma juventude de outros tempos, as mãos velhas mas firmes, quase agressivas. Pediu-me para repetir a pergunta, pronúncia do norte, e depois respondeu, encolhendo os ombros.

- Casei com ele porque era parecido com o Elvis. Mas um dia enganou-se a tomar os medicamentos.

Só lhe tinha perguntado como estava o colesterol.

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